14ª Turma do TRT considera sede dos CORREIOS periculosa, e o condena ao pagamento de periculusidade
- Antônio Valente Jr.
- 1 de abr. de 2021
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Longe de ser uma questão pacificada, a existência de periculosidade na sede dos CORREIOS na Grande São Paulo foi objeto de mais uma decisão, proferida pelo Egrégio Tribunal Regional do Trabalho da 2ª Região. Nessa oportunidade, a 14ª Turma reformou sentença proferida pela 21ª Vara do Trabalho da Barra Funda - São Paulo/SP, e condenou os CORREIOS ao pagamento do adicional de periculosidade a empregado que presta serviços naquela edificação.
O eminente Relator, Desembargador Rodrigo Garcia Schwarz, fez constar do seu voto: “a perita designada pelo juízo descreveu o local vistoriado como sendo composto por ‘3 blocos sendo Bloco I(1) com 5 andares; Bloco II(2) com 24 andares; Bloco III (3) com 5 andares, sendo interligados pelos subsolos. Explicitou que:
As edificações vistoriadas possuem 15 grupos moto-geradores (GMGs) diesel para alimentação elétrica no caso de interrupção no fornecimento da concessionária’, afirmando acerca da configuração desses motogeradores e tanques;
Com as avaliações, inspeção e vistoria nas atividades do autor, foram constados no local de trabalho do reclamante, 10 (dez) Grupos moto geradores de 550 kVA com os tanques de armazenamentos de óleo diesel integrados de 250 litros cada instalados na área externa na Face traseira do edifício, fora da projeção horizontal;
na projeção do bloco 2, no subsolo na sala 1 com porta corta fogo estão instalados 3 (três) grupos moto geradores de 355 kVA, alimentados por tanque reservatório de 2.000 litros de óleo diesel metálico, suspenso com bacia de contenção que substituiu o tanque reservatório de 10.000 litros em março de 2015;
na sala 2 há dois grupos moto geradores de 438 kVA com tanques de 900 litros de óleo diesel cada reservatórios integrados (acoplados) aos geradores;
A sala 1 é separada da sala 2 por parede de alvenaria, com porta corta fogo, respiro, aterrados, iluminação a prova de explosão, com alarme de incêndio, fora da projeção horizontal do edifício, fora da projeção estrutural vertical do edifício e com distância superior a 15 metros do local onde o reclamante labora’."
O ilustre Desembargador-relator segue destacando elementos do laudo pericial: “esclareceu que: ‘O tanque reservatório de 2.000 litros de óleo diesel metálico, suspenso com bacia de contenção substituiu o tanque reservatório de 10.000 litros desinstalados em março de 2015’, reconhecendo em resposta aos quesitos complementares formulados pelo obreiro que ‘o volume do tanque de 10.000 litros estava acima do solicitado na NR 20 item d - possuir volume total de armazenagem de no máximo 3.000 litros’.”
E prossegue: “a perita constou ainda que: ‘a reclamada não apresentou análise de risco conforme NR 20, item 20.19.3 ‘O Prontuário da Instalação deve estar disponível às autoridades competentes, bem como para consulta aos trabalhadores e seus representantes e item 20.19.3.1 As análises de riscos devem estar disponíveis para consulta aos trabalhadores e seus representantes, exceto nos aspectos ou partes que envolvam informações comerciais confidenciais’. E explicou que: ‘Óleo diesel utilizado é o S10, produto com ponto de fulgor 38º.C, classificado como inflamável na NR 20 itens 20.3.1 que são líquidos que possuem ponto de fulgor 60º C, são considerados líquidos inflamáveis e/ou combustíveis’.”
A partir daí, o notável Desembargador-relator passa a rechaçar o entendimento pericial: “do exposto, conquanto afirme a perita que o laborista não se ativava em condições de periculosidade, extrai-se das constatações feitas pela técnica de confiança do juízo que na ré há o armazenamento de óleo diesel, líquido inflamável, em um tanque 2.000 litros e em dois tanques de 900 litros (acoplados ao gerador). Em face de tal circunstância, forçoso concluir que o autor desenvolve atividades em áreas de risco, em condições de periculosidade, segundo as alíneas "b" e "s" dos itens 1 e 3 do Anexo 2 da NR-16 da Portaria 3.214/78.”
“A respeito, ressalto que a alínea "b" do item 1 do Anexo 2 da NR-16 estabelece que todos os trabalhadores da área de operação onde ocorre o transporte e armazenagem de inflamáveis líquidos e gasosos liquefeitos e de vasilhames vazios não desgaseificados ou decantados são merecedores do adicional de 30%. A alínea "s" do item 3 do Anexo 2 da NR-16, por sua vez, infere que constitui área de risco toda a área interna do recinto em que ocorre o armazenamento de vasilhames que contenham inflamáveis líquidos ou vasilhames vazios não desgaseificados, ou decantados, em recinto fechado. Verifico, no mais, que as normas de segurança vetam a existência de tanques aéreos no interior de edificações. De idêntico teor é o item 2, III, da NR-16:
‘Armazenamento de inflamáveis líquidos em tanques ou vasilhames:...
(...)
b) arrumação de tambores ou latas ou quaisquer atividades executadas dentro do prédio de armazenamento de inflamáveis....’.
“Reputo, assim, que os tanques aéreos não deveriam estar instalados no interior da edificação.”
O nobre Relator comprova ainda ter se debruçado de forma profunda no caso dos autos, ressaltando ponto ignorado por aqueles que defendem a inexistência da periculosidade na sede dos CORREIOS em São Paulo: a interligação entre os blocos, dada pelo subsolo único: “consoante disposto na citada alínea "s" do quadro atividades x área de risco, item 3 do Anexo 2 da NR-16, entendo que a área de risco para o armazenamento de líquidos inflamáveis em tanques ou vasilhames instalados em recinto fechado é toda a área interna do recinto. Irrelevante, portanto, a alegação da perita técnica de que o reclamante laborava a 15 metros do local onde estão instalados os moto geradores, porquanto segundo a própria experta, todos os blocos da ré estão interligados pelos subsolos.”
“Isso porque, em se tratando de construção vertical, como no caso, todo o edifício é considerado área de risco. Esse é o posicionamento consolidado pelo E. TST por meio da OJ nº 385 da SDI-I, in verbis: ADICIONAL DE PERICULOSIDADE. DEVIDO. ARMAZENAMENTO DE LÍQUIDO INFLAMÁVEL NO PRÉDIO. CONSTRUÇÃO VERTICAL. É devido o pagamento do adicional de periculosidade ao empregado que desenvolve suas atividades em edifício (construção vertical), seja em pavimento igual ou distinto daquele onde estão instalados tanques para armazenamento de líquido inflamável, em quantidade acima do limite legal, considerando-se como área de risco toda a área interna da construção vertical’.”
Ainda são referidos outros precedentes, cujo desfecho nesse Colendo Regional foi o mesmo do caso dos autos: “de se destacar, ainda, que corroborando tal entendimento e de modo diametralmente oposto às conclusões da técnica nomeado pelo juízo nesta reclamação trabalhista, o laudo pericial produzido nos autos do Processo nº 0000022-96.2015.5.02.0084 (fl. 129/150), relativo a empregado da reclamada que também trabalha no bloco 3 da sede da empresa, sito na Rua Mergenthaler, nº 592 - São Paulo / SP, anotou que ‘Até março de 2015 existia um tanque de 10.000 litros de óleo diesel no 2º subsolo do Bloco 2 e foi substituído por um tanque de 2.000 litros. 2. Os tanques são instalados de modo inadequado no interior da edificação em total desatenção às normas de segurança’. Concluiu, assim, que ‘O armazenamento de líquidos inflamáveis dentro do edifício se encontrava em recipientes (não enterrados). Portanto, no entender deste Perito, HÁ CONDIÇÕES DE PERICULOSIDADE nas atividades desenvolvidas pelo Reclamante pois estão enquadradas em atividades e operações perigosas com inflamáveis’, de acordo com a Lei 6.514/77 da Norma Regulamentadora - NR16 do Anexo 2 da Portaria 3.214/78 do MTE’.”
Até mesmo laudos periciais trazidas pela recorrente, como prova emprestada, foram referidos no voto condutor: “no mesmo sentido as conclusões periciais produzidas nos autos do Processo nº 0002263-79.2014.5.02.0051 (fls. 196/201), referente a reclamante que atuava no mesmo bloco III da sede da ré. Segundo atestou o experto: ‘o Reclamante EXERCE atividades em áreas de risco de armazenamento de inflamáveis líquidos (óleo diesel) em edificação, em condições de periculosidade, consoante o Anexo 2 da NR-16 da Portaria 3.214/78’.”
De forma profundamente elogiável, o sábio Desembargador-Relator destacou ainda o teor de vistoria realizada pelo Corpo de Bombeiros, realizada na sede da recorrida como consequência de inquérito civil, conduzido pelo DD. Ministério Público do Trabalho desta Região. E que cuja íntegra fora juntada aos autos: “mas não é só. A manifestação técnica emitida pelo Corpo de Bombeiros Metropolitano (fls. 60/62) é categórica em afirmar que o tanque superficial de óleo diesel de capacidade de 10.000 litros que esteve ativo na reclamada até 2015 não obedecia aos critérios de segurança previstos na NR 20 quanto:
À capacidade superior a 3.000 litros em cada um dos três tanques permitidos;
Ausência de porta corta fogo;
Ausência da aprovação pela autoridade competente;
Ausência de sistemas automáticos de detecção e combate a incêndios, bem como saídas de emergência dimensionadas conforme normas técnicas;
Ausência das medidas necessárias para garantir a ventilação dos tanques para alívio de pressão.”
E ele se encaminha para o término de se brilhante voto, ressaltando também precedentes de casos análogos: “forçoso concluir, portanto, que, durante todo o período imprescrito, o reclamante trabalha em prédio cujas instalações não se amoldam às normas de segurança e de saúde do trabalhador.” Outro não tem sido o entendimento adotado por esta Col. Turma, conforme se observa em acórdão proferido em processo movido por trabalhador que exerce suas atividades no mesmo local do recorrente, contra a recorrida: ‘RECURSO ORDINÁRIO. ADICIONAL DE PERICULOSIDADE. CONTATO COM O PRODUTO PERIGOSO. O legislador, ao definir como perigosa a atividade que implique contato permanente com inflamáveis, utilizou a expressão contato não no sentido literal de toque físico com o produto inflamável, mas sim, em relação à proximidade. Assim, a hipótese de incidência do adicional de periculosidade advém mais da proximidade do local ou agente tido como perigoso, em função do seu risco, mesmo porque muitas vezes o contato físico com inflamáveis, por si só, não causa risco, mas pode ser uma agressão à saúde do empregado (Processo nº 1000540-52.2016.5.02.0046, Rel. FRANCISCO FERREIRA JORGE NETO, 14ª Turma, publicado em 04/06/2018)’.”
“De igual conteúdo outros votos referentes a empregados da recorrida, como aqueles nos Processos nº 0001673-96.2015.5.02.0074, publicado em 26/10/2018, e 0002497-14.2014.5.02.0002, publicado em 14/12/2017.”
Não foi ignorado que o julgador não é obrigado a seguir piamente as conclusões advindas de laudo pericial, produzido pelo perito nomeado nos autos: “em face de todo o exposto, nos termos do artigo 479 do CPC, segundo o qual o Juiz não está adstrito ao laudo pericial, podendo formar a sua convicção de modo contrário, com supedâneo em outros elementos ou fatos provados nos autos, afasto as conclusões técnicas, porquanto dissociadas da realidade fática apurada na reclamada. De consequência, reformo a r. decisão, para deferir ao reclamante o pagamento do adicional de periculosidade de 30%, incidente sobre o salário nos moldes do § 1º do artigo 193 da CLT, em parcelas vencidas e vincendas. O adicional de periculosidade integra a remuneração do reclamante, repercutindo sobre férias acrescidas de 1/3, 13ºs salários e depósitos do FGTS. As parcelas vencidas ficam limitadas ao quinquênio prescricional reconhecido na origem”.
Por fim, deve ser destacada ainda a multa a que os CORREIOS estarão submetidos caso a decisão não seja reformada, e o adicional de periculosidade não seja implantado em folha de pagamento no prazo assinalado: “no prazo de 60 (dias) contados de sua notificação, procederá a reclamada a inclusão do adicional de periculosidade em folha de pagamento sob pena de pagamento de multa fixada em R$ 10.000,00 em favor do empregado”.
Além do emérito Desembargador-Relator Rodrigo Garcia Schwarz, participaram do julgamento do recurso o sábio Desembargador Davi Furtado Meireles (Revisor) e o não menos ilustre Desembargador Francisco Ferreira Jorge Neto (terceiro votante).
A decisão ainda pende de recurso.
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