
Quando o empregado vítima de uma sucessão de assaltos à mão armada (arma de fogo) - ocorridos durante a atividade de entrega postal motorizada -, desenvolve sérios problemas de ordem emocional, psicológica e psiquiátrica, sua capacidade de trabalho é sensivelmente reduzida. E, como consequência, tem direito a receber o benefício previdenciário previsto no artigo 86 da Lei 8.213/91.
Aplicando esse entendimento, a 16ª Câmara de Direito Público do Egrégio Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo confirmou a condenação do INSS ao pagamento do benefício em questão a um empregado dos CORREIOS. Além dos atrasados devidos desde o término do último afastamento acidentário, o INSS deverá pagar, mensalmente, o benefício acidentário até a aposentadoria do empregado.
O voto proferido pelo Excelentíssimo Senhor Doutor Desembargador de Justiça João Antunes dos Santos Neto – o relator do julgamento deste processo – se inicia com um breve histórico de todos os eventos que o autor da ação teve de suportar durante a relação de emprego: “... relevante iniciar a discussão dizendo que a pretensão do autor, carteiro motorizado, tem por base a alegação de que utilizava viaturas da Empregadora para efetuar a entrega de objetos postais diversos, como SEDEX, encomendas etc., e a partir 2 de janeiro de 2012, passou a ser vítima de uma sucessão de assaltos à mão armada (arma de fogo). Aduz, que passou a apresentar sérios problemas de ordem emocional, psicológica e psiquiátrica, que reduzirem sua capacidade laborativa. Que percebeu benefício acidentário, indevidamente cessado, fazendo jus ao benefício de auxílio-acidente. A ação foi ajuizada em 12/02/2020 e o INSS, regularmente citado, apresentou defesa nos autos após a vinda do laudo pericial. Há notícia da emissão de Comunicação de Acidente do Trabalho (CAT) pelo empregador (...) e boletins de ocorrências (...). Relevante mencionar que o autor percebeu auxílio-doença acidentário em virtude do acidente narrado...”. (GRIFOS NOSSOS)
Mas é quando passa a tratar do laudo pericial que o ilustre Desembargador Relator destaca os devastadores efeitos que os assaltos causaram ao Carteiro Motorizado, autor da ação: “...com efeito, realizada a inspeção médica psiquiátrica, constatou o perita, ‘humor: ansioso no momento atual; fala compreensível, ansiosa, afeto congruente, atenção, volição, juízo e crítica preservados. Pensamento lógico, progressão adequada sem delírios ou alucinações; senso percepção sem alterações durante a perícia; inteligência adequada.’ Em discussão, atestou a experta que ‘no caso em questão, a análise dos relatórios médicos, receitas, anamnese e exame psíquico da periciado indicam transtorno de ansiedade F1.9 e transtorno de estresse pós-traumático, F43.1’. Quanto ao nexo causal, atestou a perita que: ‘analisando o caso em questão, é possível considerar nexo concausal entre a patologia e trabalho, visto que o transtorno psicopatológico foi desencadeado devido aos assaltos, ameaças, agressões sofridas por assalto durante o período de trabalho. Em razão disso o mesmo não deve manter seu trabalho as ruas devido a possibilidade de outro ataque do agente estressógeno, bem como a continuidade do tratamento ambulatorial’. Por fim, concluiu a jurisperita que: ‘o periciado possui transtorno de ansiedade generalizado, pelo CID X, F41.9 e transtorno de estresse pós-traumático; há nexo concausal por doença desencadeada no trabalho; há incapacidade parcial e definitiva’ (...). Bem se vê das conclusões periciais oficiais a constatação de sequelas psiquiátricas no autor, que determinam uma incapacidade parcial e permanente...”. (GRIFOS NOSSOS)
Também não escapou ao sábio Magistrado de Segunda Instância que o INSS não conseguiu afastar a conclusão do laudo pericial: “... ressalte-se que, a autarquia quando da contestação ao se manifestar sobre a perícia, não apresentou parecer divergente para impugnar, eficazmente, o laudo pericial...”. E, sobre o nexo causal (a comprovação de que os acidentes causaram os problemas de saúde), o nobre Julgador foi taxativo: “... em relação ao nexo causal, atestou a perita que é possível considerar nexo concausal entre a patologia e trabalho, visto que o transtorno psicopatológico foi desencadeado devido aos assaltos, ameaças, agressões sofridas por assalto durante o período de trabalho. Não fosse por isso, o nexo causal está comprovado pelos documentos colacionados, em especial as CATs emitidas pela empregadora que relatam episódios de roubos sofridos pelo autor quando do exercício de sua atividade profissional, os quais encontram-se corroborados pelos boletins de ocorrência acostados aos autos. Portanto, o nexo de causa e efeito é inafastável, não só porque não infirmado pela autarquia, mas também pelo fato de o ter reconhecido ao conceder ao autor, administrativamente, auxílio-doença acidentário, em virtude da patologia psiquiátrica que padece o obreiro. Note-se que o INSS não trouxe aos autos qualquer outra prova para infirmar a perícia ou as declarações da autoria, que trouxeram elementos necessários para o estabelecimento do nexo causal...”. (GRIFOSS NOSSOS)
Em sendo assim, não poderia ser outra a decisão que confirmou a concessão do benefício previsto no artigo 86 da Lei 8213/91 ao Carteiro Motorizado: “... dentro desse quadro, comprovada a redução parcial e permanente da capacidade de trabalho e constatado o nexo de causalidade é de ser resguardada a concessão do auxílio-acidente de 50% do salário de benefício, cuja lei aplicável é a vigente na data do acidente (Lei nº 9.528/97), e correspondente abono anual, que como acessório obrigatório, mantendo-se o termo inicial do benefício definido na r. sentença , ou seja, o dia seguinte ao da cessação administrativa do auxílio-doença NB91/623.566.913-9 cessado em 30/08/2018 (fls. 161), concedido em relação ao mesmo mal decorrente do acidente de trabalho narrado, conforme dispõe o art. 86, § 2º, da Lei nº 8.213/91, aplicável à hipótese dos autos...”. (GRIFOS NOSSOS)
Além do Excelentíssimo Senhor Doutor Desembargador de Justiça Relator já nominado, também participaram do julgamento os não menos ilustres e eminentes Magistrados de Segunda Instância Luiz de Lorenzi e Cyro Bonilha.
Presidiu a solene seção de julgamento o Excelentíssimo Senhor Doutor Desembargador de Justiça João Negrini Filho.
O INSS já havia manifestado sua concordância com a concessão do benefício, requerendo inclusive a expedição de ofício para que o órgão responsável pela implantação iniciasse o pagamento. Mas, ainda assim, cabe recurso dessa decisão.
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Corrêa, Rocha & Valente Advogados Associados – Direito de ecetista para ecetista.
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