
Já expusemos anteriormente aqui e aqui que o “limbo jurídico/previdenciário” é uma das situações mais degradantes em que uma empresa pode colocar o seu empregado. Tal fenômeno se caracteriza quando o INSS considera o empregado apto para exercer as suas atividades na empregadora (concedendo alta após fruição de benefício previdenciário), mas o médico do trabalho da empresa o considera inapto para executar as suas tarefas de trabalho. Como consequência do papel social a ser exercido por toda e qualquer empresa, é dever delas acolherem e adaptarem o empregado às funções compatíveis com as suas restrições médicas, nessa fase de evidente vulnerabilidade.
Aplicando tal entendimento, a 15ª Turma do Egrégio Tribunal Regional do Trabalho da 2ª Região (Grande São Paulo e Baixada Santista) manteve a sentença proferida pela sábia Juíza Federal do Trabalho Talita Luci Mendes Falcão, da 84ª Vara do Trabalho da Barra Funda – São Paulo/SP. A decisão mantida condenou os CORREIOS ao pagamento dos salários (e reflexos) devidos a um empregado. Nessa oportunidade, o empregado autor da ação trabalhista obteve alta previdenciária. Entretanto, por considera-lo inapto para reassumir suas atividades profissionais, a empregadora impediu que este retornasse ao trabalho, lançando-o no odioso limbo previdenciário. O empregado ficou sem receber qualquer valor do empregador entre março de 2016 e outubro de 2020, o que se manteve até o deferimento da tutela de urgência (concedida pelo Juízo da Origem em meados de outubro de 2020). Somente aí a empregadora permitiu o retorno do empregado que moveu a reclamação trabalhista ao trabalho.
A ilustre Desembargadora-Relatora Sônia Maria Lacerda inicia os fundamentos do seu brilhante voto vencedor, destacando que a empregadora não negou vários dos fatos essenciais para que o empregado fizesse jus ao pagamento dos salários: “... antes de mais nada convém assinalar que não há qualquer controvérsia de que o reclamante se afastou do trabalho após o acidente de trabalho ocorrido em 25.04.2013 e recebeu benefício previdenciário até 16.03.2016, momento a partir do qual o INSS cessou os pagamentos, por entender que o autor tinha recuperado sua capacidade laborativa. Também não se discute que após a alta previdenciária, o autor foi examinado pelo serviço médico da reclamada, sendo considerado inapto, o que motivou nova solicitação de benefício previdenciário, contudo indeferido pelo INSS. Diante da situação fática apurada nos autos, emerge o acerto da sentença, cujos fundamentos são irretocáveis...” (GRIFOS NOSSOS)
Logo em seguida, a nobre Magistrada de Segunda Instância destaca a função social, existente de forma intrínseca nos contratos de trabalho: “... com efeito, cessado o pagamento do benefício previdenciário, como consequência natural o empregado deve retornar ao trabalho e a empresa deve retomar o pagamento da contraprestação. Afinal, a suspensão do contrato de trabalho ocorre apenas nos períodos de efetivo recebimento do benefício previdenciário, nos termos do art. 476 da CLT. E cessado este, o contrato de trabalho volta a vigorar em seus normais efeitos. Havendo divergência entre a conclusão adotada pelo INSS e aquela exarada pelo serviço médico da empresa, aquela deve prevalecer em razão mesmo da presunção de legitimidade dos atos administrativos. Nesse contexto, considerando sua patente condição de interessada, cabe à empresa o ônus de interpor recurso para uma das Juntas de Recursos do Conselho de Recursos da Previdência Social, pleiteando o reexame da questão, inclusive, podendo juntar documentos que julgar convenientes...”
E é justamente como consta do final do parágrafo anterior, onde a sábia Desembargadora Relatora destaca que, caso a empregadora não concordasse com a alta médica dada pelo INSS ao empregado, o correto não é impedir o retorno dele ao trabalho. Deve permitir que o empregado retorne às suas atividades profissionais (respeitadas as suas restrições médicas/físicas), e questionar a decisão que concedeu a alta previdenciária nas esferas adequadas: “... portanto, ao constatar que o reclamante não estava em gozo do benefício previdenciário e para evitar a indesejada situação de limbo jurídico, a ré deveria ter se insurgido contra a decisão do INSS concessiva da alta. Contudo, não há nos autos qualquer elemento indicativo de que a empresa reclamada tenha adotado tal procedimento. Portanto, restou evidenciado que a empregadora permaneceu inerte quanto à situação do reclamante perante a autarquia previdenciária, olvidando-se que todos os encargos decorrentes de sua atividade não podem ser transferidos ao empregado, parte mais frágil na relação de emprego, por intelecção dos artigos 2º e 3º da CLT...”
Com tais argumentos, a ilustre Julgadora encerra o voto vencedor, dizendo não haver motivo algum para a reforma da decisão que condenou a empregadora ao pagamento dos salários (e reflexos) devidos desde março de 2016 a outubro de 2020, em virtude de limbo previdenciário: “... por isso, imperiosa a confirmação da sentença singular, que impôs à recorrente a obrigação de pagar os salários e demais consectários desde a alta previdenciária até o efetivo retorno da obreiro ao trabalho. Então, nada a reformar.” (GRIFOS NOSSOS)
Além da brilhante Desembargadora Relatora já nominada, participaram do julgamento os não menos ilustres e eminentes Magistrados do Trabalho Ricardo Apostólico Silva (brilhante Juiz Convocado e Revisor), Ana Cristina L. Petinati (sábia Desembargadora e Terceira Votante, que também presidiu a solene seção de julgamento), bem como o DD. Representante do Ministério Público do Trabalho da 2ª Região (Grande São Paulo e Baixada Santista).
Cabe recurso dessa decisão.
Saiba mais aqui.
Corrêa, Rocha e Valente Advogados Associados – Direito de ecetista para ecetista.
Comments